quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Fiat Lux


Ouvimos há dias, do ministro da defesa, Augusto Santos Silva, um discurso mitológico. Do ministro da defesa? Sim, dele mesmo! Num emaranhado de analogias e alusões aos deuses pagãos da mitologia romana, ouvimo-lo orar, na Assembleia da República, com grande retórica. Pensei de imediato que estivesse a defender o regresso a uma cultura de valores, de princípios e de saberes, ou não tivesse ele sido ministro da educação na viragem do século. Ao ouvir mais atentamente, verifiquei que era apenas mais um discurso irónico e cínico, típico da classe política a que já nos habituámos.
Num acto de contrição, lembrei-me que ministro deriva da palavra latina minister, que significa “servidor, escravo, subordinado, instigador” – talvez o “malhar na direita” venha deste último! Se o seu cargo derivasse da palavra magister, ele seria certamente um professor ou um mestre (significados literais dessa palavra) e teríamos ouvido dele uma verdadeira aula magistral… Veja-se a ironia e a inversão semântica dos papéis dos ministros e dos professores actuais; estes chefiavam e agora servem, aqueles serviam e agora chefiam…
Comemorámos também recentemente o centésimo aniversário da nossa res publica; a sociedade perfeita e harmónica idealizada por Platão tornou-se uma realidade para os filhos de Luso há cem anos. Passado um século, continuamos cada vez mais dentro da caverna e mais distantes do sol, pois ele é ofuscado pela poeira do país das maravilhas de Sócrates (o actual, claro!). Sorte contrária tiveram, felizmente, os mineiros chilenos, que graças à solidariedade humana, conseguiram sair do reino de Vulcano e voltar a ver a luz de Apolo.
Fiat lux (faça-se luz) em toda a humanidade e ela perdurará, caso contrário, os valores universais perder-se-ão. E qual será a consequência disso? O que nos acontecerá? “Culpa est non praevidere quod facile potest evenire:” - É culpa não prever o que facilmente pode acontecer.

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